De Passagem.

O que passa por mim não somente passa. Foi uma lei que criei no meu estado de direito. Como pode, meu Deus, um vento, brisa, alguém, coisa, divisa, passar por mim e não me avisa e ainda assim terminar como veio: igual? Não pode. Não pela minha lei. Não, eu não entendo nada de leis, confesso. Mas confesso que as crio mesmo assim, na rebeldia e na ignorância. Simplesmente porque são minhas e as minhas leis quem dita, respeita ou negligencia sou eu. Eu quebro minhas leis o tempo todo. Você não quebre, por favor. É uma das leis pra me amar. Eu sei que não é fácil, mas todas as leis têm suas belezas e feiúras. Por exemplo, esta sobre a qual falo a vocês.

O que passa por mim não somente passa. É proibido. Essa lei já foi fruto de uma ideia, foi promovida a um Sonho e desde lá se impregnou em mim feito perfume que entra na pele. Fiz um acordo de escambo com tudo e todos que passam por mim nesse espirro de vida: passou, levou um pedaço de mim, mas eu levo também. Ah, levo. E isso é inegociável. É quase um roubo mútuo, contudo, voluntário e com tudo.

Termina que hoje sou uma aparente normalidade tranquila, mas na verdade me tornei um grande depósito de passagens furtivas, demoradas, permanentes, de gentes, de estradas, de trens, gostos, casas e interior.

Como não transbordo?

Eu transbordo o tempo inteiro.

Mas distribuo riquezas que ganhei por aí,

Muito de bom, pouco de ruim,

Não precisa de dinheiro.

É só passar por mim.

Clarice.

Este texto foi resultado de ouvir seguidas vezes a nova música de Sofia Freire, minha irmã e do meu pai, Wilson Freire.
Poesia de família dá nessas coisas.

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